Em sua terceira edição, o Datathon premiou, nesta sexta-feira (26), os três melhores projetos com o objetivo de buscar soluções para os problemas enfrentados pelas Pessoas com Deficiência no serviço público. O diferencial desta competição de inovação aberta é unir, em formato de imersão, a busca de resoluções dos desafios propostos a partir de dados com a experiência de vida trazida por servidores com deficiência.
O evento, realizado ao longo de toda a semana pela Enap e pela Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, foi uma competição de inovação aberta que utilizou a metodologia de maratona de dados que reuniu servidores públicos, estudantes, acadêmicos e outras pessoas, com e sem deficiência, todas interessadas em identificar o que os dados disponíveis poderiam fornecer de informações na busca por soluções no âmbito do Executivo federal que ampliem a contratação e a ascensão de pessoas com deficiência ao serviço público e a cargos de liderança.
Anna Paula Feminella, secretária nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que participou da abertura, do encerramento, e da banca avaliadora, destacou que "acessibilidade não é um bem só para quem tem deficiência. Ela é um bem coletivo que precisa ser entendido para isso". “Venceu o Estado brasileiro”, afirmou.
A equipe “Crisálidas” - composta por Alessandra de Pádua Boato, Brisa Queiroz Martins, Joziellen da Silva Auteiro, Mariana da Fonseca Ornelas de Azevedo e Rafael Moraes da Silva - foi a vencedora desta terceira edição, com a proposta de criação de um portal para auxiliar órgãos federais na contratação de serviços e equipamentos para adaptação e inclusão das pessoas com deficiência.
“O Datathon muda nossas vidas. E quando ele nos muda, nos ajuda a mudar a vida dos outros”, afirmou Mariana de Azevedo, vinda de Angra dos Reis (RJ), após ser premiada com o primeiro lugar na competição.
O coordenador-geral de Ciência de Dados da Enap, Pedro Masson, salientou que a competição agrega diferentes aspectos que sua coordenação tem trabalhado. "O Datathon é uma iniciativa que une aquilo em que acreditamos. Em primeiro lugar, o tema de dados não é assunto apenas de TI. Além disso, a diversidade enriquece as análises e o uso de dados", afirmou ele.
Das cinco equipes de até seis integrantes – com e sem deficiência -, três foram premiadas e duas receberam "Menção Honrosa". Porém uma novidade desta terceira edição é que todas as análises de dados realizadas pelas equipes estarão na publicação que reunirá o conhecimento produzido durante o evento.
Confira a classificação das equipes:
1º - Crisálidas
2º - Hefesto
3º - Pessoas com Excelência
Menção Honrosa – Jangada
Menção Honrosa – Suprema Inclusão
Após a premiação, a secretária dos Direitos da Pessoa com Deficiência se propôs a seguir debatendo com as cinco equipes os projetos apresentados nesta edição do Datathon, com o objetivo de levar uma proposta de ação “que seja fruto dessa confluência de ideias” ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para entrar na segunda etapa do programa Viver Sem Limite.
"A agenda de conhecimentos sobre esse tema não acaba. A gente precisa de muita humildade, muita paciência histórica. E ela só vai se consolidar com essa força do diálogo, de a gente construir junto e unificar esses conhecimentos. Temos muito para avançar ainda. Nossa linguagem ainda está muito carregada de capacitismo."
O diretor de Gestão Corporativa (DGC) e representante da presidência da Enap, Lincoln Moreira Jorge Junior, também salientou a importância de ver as ideias desenvolvidas no Datathon materializadas como políticas públicas. “A gente espera ver muitas coisas que foram apresentadas aqui sendo transformadas em ideias, projetos e políticas públicas.”
Alexandre Gomide, diretor de Altos Estudos da Enap (DAE), reforçou que o Datathon “é uma maneira estimulante colaborativa de encontrar soluções inovadoras para problemas públicos”. “Isso mostra o compromisso da Enap e deste governo de eliminar todo tipo de discriminação e desigualdade", completou Gomide.
Já para o diretor substituto de Inovação da Enap (GNova), Pedro Marcante, o diferencial do Datathon está na união do cruzamento de dados com a experiência de vida de pessoas reais. “O número lá na página no boletim estatístico não quer dizer nada se a gente não agrega em cima dele vivências pessoais, individuais e coletivas. O Datathon tenta juntar esses dois elementos - os dados e as experiências individuais - para dentro da análise.”
Keicielle Schimidt, coordenadora-geral de Inovação Aberta da GNova, ressaltou que o perfil de metodologia aplicado no Datathon facilita a capacidade de colaboração dos grupos e amplia o potencial de haver “soluções que vão resolver de fato os problemas”. “A gente ouviu aqueles que lidam com os problemas, e não só quem está ali atrás de uma mesa no escritório imaginando o que pode ser a solução. Estou muito satisfeita com o resultado. Para quem foi acompanhando ao longo da semana, é impressionante ver a qualidade dos trabalhos apresentados."
Integrante da equipe “Hefesto”, que ficou em segundo lugar, Leonardo Antonio de Moraes Filho, cego desde a infância, relatou a dificuldade encontrada ao assumir como servidor do Ministério Público Federal. “Só [encontrei] falta de acessibilidade e barreira de toda ordem”, relatou.
A própria experiência de vida, com a superação dos obstáculos encontrados no serviço público, foi o que levou ele e muitos outros participantes a se inscreverem no Datathon para ajudar a desenvolver ideias para não só ampliar a inclusão de pessoas com deficiência no funcionalismo como também melhorar a adequação dos espaços e dos fluxos de trabalho para acolhê-las da melhor forma.
Soluções apresentadas
Entre as outras propostas apresentadas ao final desta terceira edição do Datathon, estão a criação de um cadastro único da pessoa com deficiência no serviço público e de um programa para combater o capacitismo estrutural e a falta de perspectiva de futuro na carreira, principais entraves identificados pela equipe para a ascensão de pessoas com deficiência a cargos de liderança no Executivo. Para isso, seria criado um site para ajudar na construção da autoestima, para que o servidor tenha confiança para almejar cargos de liderança e crescer na carreira pública.
Também foi sugerida a capacitação de mais ledores e intérpretes de libras no Executivo Federal, bem como a implementação de novos cursos voltados à capacitação de pessoas com deficiência e à inclusão desse público, como os já oferecidos pela Enap para fomento de liderança de mulheres negras, por exemplo.
Houve ainda a proposta de criação de um “Observatório da Inclusão”, para monitorar as taxas de ocupação de vagas e de cargos de chefia por pessoas com deficiência em órgãos federais, e de editais específicos para pessoas com deficiência em concursos públicos. Todas as equipes se utilizaram do cruzamento de dados disponíveis em sistemas do governo federal para embasar as soluções idealizadas, mostrando o baixíssimo grau de cargos públicos ocupados por pessoas com deficiência, muitas vezes abaixo do mínimo de 5% exigido em concursos públicos pela lei atual.
Servidora da Justiça Federal da Paraíba com deficiência auditiva, Clarissa Gomes de Sousa destacou que a importância de pensar nos servidores com deficiência vai muito além da oferta de vagas em sistema de cotas. Ela defendeu a necessidade de se detalhar a característica e as atribuições das vagas nos editais para evitar pedidos de exoneração posteriores por parte de pessoas com deficiência que porventura venham a se candidatar mesmo sem terem condições de atuar naquele cargo por causa da própria deficiência.
Sobre o Datathon
A competição foi dividida em quatro fases principais: conceitos; design de problema; ideação e prototipagem; e pitch. Os participantes passaram, ao longo da semana, por oficinas de sensibilização e letramento, design thinking e letramento em dados, onde foram introduzidos a noções básicas de uso de ferramentas para cruzamento de dados.
Gabriel Lima Simões, pessoa com deficiência congênita e doutor em Políticas Públicas e Formação Humana pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), foi um dos facilitadores das oficinas de sensibilização. Ele detalhou como o capacitismo estrutural é replicado na escola, no trabalho e no dia a dia das instituições, e como constantemente se vê tendo que justificar a própria capacidade de executar ações e de ser um servidor público. “O capacitismo vê a deficiência como uma falha, um defeito.”
Em seguida, os grupos partiram para as ideações e discussões que levaram à maturação das soluções apresentadas à banca avaliadora neste dia final da maratona.
Edições Anteriores
O primeiro Dathaton, realizado em março de 2023, abordou o tema "Desigualdades de Gênero no Serviço Público" e buscou soluções para os múltiplos desdobramentos que a desigualdade de gênero pode gerar dentro do serviço público, como na diferença salarial e na ocupação de postos de chefia.
Como produto do encontro, cada equipe apresentou ao final uma proposta de como usar esses dados visando reverter essas desigualdades. A grande premiada da primeira edição foi a equipe que apresentou o projeto NomeiaELA - Painel de Paridade de Gênero em Cargos de Liderança.
A segunda edição do Datathon, em novembro de 2023, abordou o tema "Desigualdades Raciais" e mirou na busca de possíveis soluções para os desafios propostos no serviço público em torno dessa questão. Além do letramento de dados, essa edição contou também com letramento racial para os participantes.