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Interdependência, interseccionalidade e a ética do cuidado foram alguns dos princípios debatidos no evento de abertura no palco Brasil Que Cuida

Iris Borges

Começou a 10ª edição da Semana de Inovação (SI), e a atividade que abriu os trabalhos no Palco Brasil Que Cuida não poderia trazer um debate melhor do que “Cuidado e Anticapacistismo”. Um assunto fundamentalmente pautado pela temática principal da SI, “Novas Formas de Cuidar”. Para a mesa redonda, foram convidadas a secretária nacional de Direitos da Pessoa com Deficiência, Anna Paula Feminella, a fundadora do Instituto Caue e integrante do coletivo feminista Hellen Keller, Mariana Rosa, e a doutora em psicologia social, ativista na área de estudos da Deficiência, além de conselheira e pesquisadora do Instituto Caue, Karla Garcia Luz.

Segundo a secretária do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), essa conversa é desafiadora, já que o capacitismo, assim como outras formas de preconceito, remonta milênios, especialmente das sociedades ocidentais. “Agora é a hora da gente conversar sobre o que é capacitismo, o que que tem a ver construir uma política nacional de cuidados, uma sociedade de cuidados, reconhecendo que as pessoas com deficiência são sujeitas de direitos, têm direito de escolha e autonomia”, alertou Anna Paula Feminella.

A ideia é garantir o apoio irrestrito para a consolidação dos direitos da pessoa humana. E não se trata apenas de cuidados para necessidades elementares, como as básicas, já reconhecidas, de alimentação e higiene, por exemplo. Mas o direito elementar de acesso a todos os outros direitos.

Para a psicóloga Karla Luz, o cuidado é um conjunto de práticas de relações humanas para a manutenção da vida individual e coletiva. "Hoje, para estar aqui, por exemplo, nesse momento, eu precisei de uma série de mediações de cuidado. O cuidado é essa possibilidade do pleno exercício da cidadania e a possibilidade de transitar pelo mundo. É inerente a todas as pessoas. Todos nós dependemos de cuidados, a depender das circunstâncias da nossa vida”, afirmou.

Karla também explicou na sua fala sobre os princípios básicos da Justiça Defiça, um conceito que surgiu do ativismo entre pessoas com deficiência em 2019.  O primeiro princípio é a interseccionalidade, que, de acordo com a pesquisadora, tem a ver com acessos de maneira diferenciada aos direitos. “Até pouco tempo atrás, mulheres cadeirantes não faziam exames de mamografia, porque a máquina foi feita para pessoas que ficam em pé. Então, imaginem quantas mulheres com deficiência adoeceram ou perderam a vida porque não puderam acessar um direito à saúde?”, questionou.

Para finalizar, ela destacou a interdependência, que desmistifica o mito do sujeito independente. “A gente precisa visibilizar e conferir um caráter humano à dependência. A gente é cuidado e também pode cuidar. Essa dupla face do cuidado é interessante, o cuidado é muito dinâmico”, avaliou Karla.

No debate sobre a ética e o cuidado, as especialistas ressaltaram ainda o poder de escolha do sujeito que recebe os cuidados. “A ética do cuidado é o fio condutor das práticas de cuidado que visam o bem-estar, o bem-viver e o bom-cuidar de alguém, sempre levando em conta o desejo do sujeito cuidado para a sua vida. A ética do cuidado exige que o que é oferecido como cuidado seja assumido e apropriado pela pessoa cuidada”, afirma o conceito criado pelo Instituto Caue e lido durante a mesa redonda.

Com P de política 
“Essa discussão é, antes de tudo, política com ‘p’ minúsculo e com ‘P’ maiúsculo. Minúsculo porque faz parte do dia a dia e maiúsculo porque precisamos pensar em cuidado e democracia”, explicou a fundadora do Instituto Caue, Mariana Rosa.

Ela citou a experiência como aprendizado e a importância da compreensão da deficiência sem estar aprisionada a prescrições médicas. “A gente acha que para se relacionar com uma pessoa com deficiência precisa saber tudo sobre a deficiência e não sobre a pessoa. Não dá para reduzir a experiência ao diagnóstico. A abertura para a singularidade da experiência vai vincular a gente para a experiência anticapacitista”, ressaltou.

Mariana explicou que o capacitismo é justamente a ideia de agrupamento e hierarquização das pessoas a partir de presunções. “Se eu me abro para o outro enquanto uma pessoa singular, irrepetível, eu posso me abrir para a possibilidade do encontro. O anticapacitismo é ancorado no cuidado”, concluiu.

“Essa agenda é uma agenda de todos nós. Somos 15% da população mundial. Então, podemos adquirir uma deficiência a qualquer momento. Essa condição humana, ainda tão invisibilizada, sempre existiu na história da humanidade inteira e precisa ser conhecida”, concluiu a secretária Anna Paula Feminella.

A colaboradora do quadro de professores da Enap, responsável pelas formações anticapacitistas da Escola, Fernanda Boaventura, participou da primeira mesa redonda no palco “Brasil que Cuida” e agradeceu o acolhimento da Escola na organização do evento. “Desde as semanas anteriores ao evento já me senti acolhida pela Enap, com a disponibilização de um grupo de WhatsApp de Atendimento Acessível. Já na chegada, fui encontrando no ambiente as palavras ‘equidade, inclusão, acessibilidade e diversidade’, dentre tantas outras mensagens de responsabilidade social nos espaços, e confirmei que é um lugar para se estar compartilhando essa mensagem de pluralidade do mundo em que vivemos. Isso é inovação, sem dúvidas”, comemorou.

Sobre a Semana de Inovação
A Semana de Inovação 2024 é realizada pela Enap, em parceria com a Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), o Ministério das Mulheres e o Tribunal de Contas da União (TCU), com apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e tem patrocínio de Petrobras, Itaipu Binacional, Instituto Unibanco, Microsoft, IBM/TD Synnex, Fundação Lemann, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), CGI.br, Serpro, Dataprev, Caixa e Governo Federal.

SERVIÇO:
O quê: Semana de Inovação 2024 (entrada gratuita)
Onde: Escola Nacional de Administração Pública - Enap (SPO Área Especial 2-A, Asa Sul, Brasília-DF)
Data: 29, 30 e 31 de outubro
Formato: Presencial e On-line (Apenas as atrações de palco principal serão transmitidas. As demais atividades presenciais só para os participantes in loco. A programação on-line é exclusiva para inscritos on-line)
Mais informações e inscrições:  
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