na Escola Nacional de Administração Pública (Enap), em Brasília-DF, tem como tema As formas da Antipolítica.
O objetivo desse novo ciclo, concebido por Adauto Novaes, é discutir os temas mais urgentes que envolvem as relações entre democracia e política na era das grandes mutações produzidas pela tecnociência.
Helton Adverse é doutor em filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da qual é professor. É pós-doutor pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais. Especializou-se em filosofias políticas renascentista e contemporânea, com ênfase na tradição republicana e no sentido político.
Sinopse da palestra As formas da Antipolítica
Qual é o "outro" da política? Na Grécia clássica, seu "outro" era a tirania. A cidade democrática não podia construir uma imagem de si mesma sem evocar a figura do tirano, sua negação e, ao mesmo tempo, a diferença fundamental que lhe conferia identidade. E qual seria o "outro", ou os "outros", da democracia contemporânea ou, ainda, quais seriam as formas da antipolítica na atualidade? Podemos levantar algumas hipóteses: a primeira delas é, como já haviam assinalado Hannah Arendt e Claude Lefort, o totalitarismo. Contudo, o fenômeno totalitário consiste em uma negação sistemática do regime democrático, isto é, embora ele possa emergir no interior das sociedades democráticas, sua implementação coincide com o desaparecimento da democracia: onde um está o outro não está. Nesse sentido, o totalitarismo é a mais radical negação da política. Mas o que gostaríamos de pensar é se a democracia contemporânea não cria em seu interior formas de antipolítica e, em alguma medida, com elas convive, embora seja por elas ameaçada. Poderíamos então elencar algumas delas: 1) a derrisão (a desqualificação da política tout court); 2) a espetacularização (a transformação da política em espetáculo midiático); 3) a moralização (a redução da política à moral); 4) a tecnicização (a captura da política pela tecnologia); 5) a judicialização (misto de tecnicização e moralização: a política é enquadrada pelo aparato jurídico que se fundamento na ideia de justiça). Sem configurar a negação radical da política, essas formas de antipolítica desempenhariam um papel dentro do sistema democrático. Nesse sentido, por mais paradoxal que seja, elas seriam simultaneamente formas da política. A derrisão, por exemplo, ao desqualificar a política em sua integridade, não se posiciona absolutamente fora do espectro político porque abre o caminho para a instauração de um regime autoritário. A moralização pode fazer o mesmo, na medida em que é a sementeira da demagogia. A espetacularização é a recusa a política tradicional em nome de um messianismo vulgar. A tecnicização não anuncia a época de um governo asséptico, plenamente regido por imperativos econômicos e sociais, mas viabiliza uma forma de dominação mascarada pelo princípio da racionalidade. A judicialização, por sua vez, resulta no incremento do poder de uma de suas instâncias, isto é, o poder judiciário. Por conseguinte, as formas da antipolítica na sociedade democrática não preparam o advento de uma vida comunitária nova, onde a política estaria ausente ou neutralizada. Ao contrário, elas podem ser consideradas lutas políticas na medida em que ensejam a transformação das relações de poder.
Confira o programa do ciclo Mutações em Brasília:
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